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Artigo: Sem estudo, sem técnica e sem viabilidade

Com a Lei Anticorrupção Empresarial e políticas de “compliance” em meio às operadoras de limpeza urbana, diferentes municipalidades passaram a defender a adoção do pregão eletrônico ou a inversão de fase nas licitações dos serviços de limpeza pública ou de varrição, sob frágil entendimento de que se tratavam de serviços comuns.

Desvalorizando a atividade e desqualificando seus profissionais, os editais abriram mão da apresentação da metodologia de execução e das Anotações de Responsabilidade Técnica do corpo de engenharia das licitantes, promovendo a piora, a precarização e a descontinuidade dos serviços, na medida em que passaram a priorizar o preço em detrimento da qualidade.

A essa corrente de ocasião, juntou-se a atual gestão da Autoridade Municipal de Limpeza Urbana do Município de São Paulo-AMLURB, desconsiderando os parâmetros fixados pela Lei Nacional de Saneamento, Política Nacional de Resíduos Sólidos e legislações conexas, que objetivam evitar contratações que não tenham viabilidade.

A AMLURB  não só contrariou  todo o seu entendimento pretérito como desprezou o posicionamento do Conselho Federal de Engenharia e Agronomia – CONFEA, do Núcleo de Pesquisa em Organizações, Sociedade e Sustentabilidade – NOSS da USP, que comungam do entendimento que os serviços indivisíveis de limpeza urbana da cidade são de alta complexidade técnica, exigindo a apresentação da metodologia de execução ou planos de trabalho na fase de habilitação, cuja aceitação antecede sempre à análise dos preços

Sem ter como justificar as razões que informaram o edital, a autarquia não realizou o EVTE- Estudo de Viabilidade Técnica e Econômica determinado pelos marcos legais, recusando-se a dialogar com a sociedade e as operadoras do setor de limpeza urbana quanto a como especificar, organizar e executar uma gama de 17 serviços diferentes, em uma cidade de cerca de 12 milhões de habitantes.

Basta olhar as respostas evasivas dadas aos questionamentos feitos ao edital nas impugnações promovidas pelos interessados, para comprovar a  tentativa de se impor uma licitação destinada tão só a promover  uma rasa repartição de mercado, que ignora a distribuição do conjunto de  infraestruturas da atividade, seus intrincados fluxos logísticos, as tecnologias empregadas, a mão de obra intensiva mobilizada,  a expertise dos seus técnicos de nível superior e os reais custos de capex e opex desses serviços, para reduzi-los à dimensão de mera alocação de mão de obra e equipamentos.

Resta aguardar que os  órgãos judiciais e de controle interrompam esse  retrocesso e exijam que o Município dialogue com sociedade e o setor empresarial a viabilidade técnica e econômica dos serviços que pretende entregar aos paulistanos, que não mais admitem a volta do faz de conta municipal na gestão e prestação desse  serviço essencial para a qualidade de vida e bem estar de todos.

 

Célio Egidio da Silva é Advogado, Jornalista. Doutor em Filosofia do Direito e do Estado pela PUC/SP Professor e Coordenador de Cursos de Jurídicos. Especialista em Interesses Difusos e Coletivos pela Escola do Ministério Público de São Paulo-SP.